10.6.08

Cheiro da Missão

Luís Gustavo Patrocínio
Estudante de Ciências Sociais
ABU Londrina (PR)

A primeira impressão que tive no meu primeiro dia de aula aqui na Universidade Estadual de Londrina (UEL) foi “como esse lugar fede cigarro!”, em uma pesquisa rápida notei que de 50 alunos 10 não fumavam e esse numero diminuiu na primeira semana para 8. Não suporto cheiro de cigarro, e já quis desistir do curso, pensei: “Deus do céu! Não vou conseguir estudar com esse cheiro, preciso necrosar meu nariz se quiser continuar ou vir com um prendedor de roupas pendurado nele”.

Situações como essa são bem comuns em quase todos os ambientes, há sempre incômodo e desconforto no novo e nas pessoas. A repulsa e o nojo nos conduzem automaticamente /inconscientemente a áreas de conforto. Nossa capacidade para se afastar do que não nos agrada é violenta e sutil e esses dois componentes juntos têm a propriedade de “cegar” nossa percepção e a naturalizar. Se acrescentarmos uma pitada de moralidade, além da naturalização conseguimos também justificar a ação com argumentos dificilmente contestados. Porém não é a nossa natureza má e não são más as direções dos nossos impulsos naturais? Não há na Bíblia varias advertências evidenciando nossa tendência ao pecado e nos alertando para um revestimento de uma nova natureza apartir de uma transformação (metanóia) de toda nossa perspectiva e percepção do mundo? (Rm 12:1- 2)

Acredito que essa busca pela área de conforto, o anseio de fugir dos incômodos, nos levem também a nos separar daqueles que os causam, acabamos por personificar as ojerizas e deixamos de nos relacionar com os carrascos da nossa comodidade. Talvez seja esse um dos fatores das formações dos “guetos”, principalmente dos “guetos” evangélicos. Quão comum é ver grupos de “cristãos” reunidos, justificando-se pela ordenança da comunhão bíblica, por serem incapazes de sofrerem os desconfortos, que os vulgarmente denominados “mundanos”, causam.

Voltando ao momento em que pensava...tudo bem, admito... murmurava para mim mesmo... sobre o cheiro dos cigarros. Recordo que logo após a minha expressão de desconforto e de expor toda minha apologia anti-tabagista , (traduzindo, murmurar para outros renvidicando razão) O Espírito Santo me fez lembrar de uma pregação que ouvi quando estava no seminário proferida por um pastor de uma igreja numa comunidade muito carente. Ele dizia:

“... o pastor precisa ter cheiro das ovelhas que cuida, e no meu caso cheiro de pessoas que não tem acesso a banhos diários por faltar infra-estrutura adequada em suas moradias. É preciso não se incomodar quando comer nessas casas onde a higiene necessária é impossível pela condição, e não se importar com o odor do esgoto que corre a céu aberto durante as refeições e por todo o dia. É preciso ter cheiro das ovelhas!”


Me fez lembrar também das refeições que fiz na minha parte prática do Instituto de Preparação de Líderes... aff! E que refeições... meu amigo P. de Vitória que o diga.

Essas memórias me fizeram refletir sobre minha postura natural, como estava sendo egoísta e buscando minha satisfação, como em cinco minutos de insatisfação criei um “gueto” dos anti-tabaco na minha sala. Por que não poderia ter cheiro de cigarro? Por que deixaria que meu senso de conforto e minha incapacidade de suportar dores pelo próximo fossem mais fortes que meu chamado como missionário naquele lugar?

Graças a Deus, e isso não é uma expressão é uma afirmação, voltei à postura que não deveria ter abandonado, orei pedindo para conseguir suportar o cheiro e hoje não tenho mais muitos problemas, posso ter comunhão, sem abandonar meus valores, com quem realmente precisa de uma outra perspectiva de vida. Hoje posso dizer que Deus me abençoou com algo melhor que um canto com ar puro, me deu cheiro do cigarro daqueles que Ele ama e não alcançou ainda. Fico “fedido”, porém posso cumprir minha missão.

A intenção desse texto é nos despertar para essa realidade sutil a qual somos arrastados cotidianamente. Meu relato visa mostrar que somente Deus pode nos livrar de formar guetos confortáveis e assim sucumbir a missão, esquecer o sentido do IDE e nos tornar insossos nos nossos cursos, afinal a única razão de ser missionários é o próximo sem Deus.

Pai eterno, misericórdia.

As opiniões expressas no texto são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, as posições da ABUB.

4 comentários:

Anônimo disse...

Meu irmão, é muito "bom" receber essas pancadas de Deus. N estou falando da q vc levou, mas da q estah doendo em mim. Que Deus tenha misericórdia de mim, pois, se depender d mim, fico na comodidade. O IPL começou a mudar meu coração (a parte prática foi tremenda, ou seja, foi muito boa e fez tremer). Que o Senhor continue nos guiando para fora da "zona de conforto".

Flávio Américo

Anônimo disse...

Luiz Gustavo, seu texto me fez lembrar dos pescadores malcheirosos, como fala o autor do livro "Jesus de Pés Sujos", com os quais Jesus andava...Talvez o odor de peixe fosse pior que o cheiro de cigarro...Também lembrei-me de quando Jesus TOCOU um leproso coberto de chagas purulentas... Ele viveu a missão com os cinco sentidos!:D

Que Deus tenha misericórdia do nosso egoísmo, preconceito e falta de amor ao próximo.

Dayane de Assis.

Anônimo disse...

Boa reflexão Gustavo, que Deus nos ajude sempre a perceber aquilo que nos impede de viver integralmente o Evangelho.
Grande abraço amigo.
Jerusa

Anônimo disse...

Oi Gustavo, como é bom ver Deus agindo assim, nos levando por caminhos desconhecidos, nos fazendo trafegar por rotas inseguras! Essa foi uma das lições que aprendi no IPL! Que possamos vivenciar essa entrega diária, à vontade dEle e não a nossa! Um grande abraço! Cássia Suranéia.